terça-feira, 23 de dezembro de 2014

      Mais uma noite e nada. Geralmente era neste momento, quando o silêncio caia, que elas  surgiam. Uma a uma vinham como em cascata a me envolver. Já fazia uma semana a última aparição.  Vínhamos nos entendo bem até então mas, do mesmo modo que chegaram, foram embora. Saíram de mansinho sem pedir licença. Mudei o cenário, coloquei uma música tranquila, li Machado novamente e nada. Deveria ser proibida essa ausência repentina, pois já faziam parte de mim. Todos os dias naquele mesmo espaço eu as procurava.  De repente em meio ao devaneio uma resolveu se engraçar, apareceu como quem não quer nada. “Era”. Chamei outras e não obtive sucesso. Elas precisavam uma das outras para fazerem sentido. Elas haviam mudado a minha vida, quando juntas conversavam entre si e me surpreendia com tamanha harmonia.  Agora estava eu ali, seguindo o mesmo ritual para recebê-las e nada. Elas precisavam acabar o que haviam começado. Pensei por um momento o que Machado faria em um momento assim, será que ele havia passado por um martírio como este? 
     Um vazio abateu-se sobre mim.  A minha alma estava inquieta, o corpo descansava, mas a alma não.
      Desolada resolvi dormir.
     Já quase dormindo, elas me apareceram. − “Era... uma... bela ou chuvosa ... manhã ou tarde ... de... outono ou verão...”. Elas conversaram entre si e se organizaram: − “Era uma chuvosa tarde de verão...”. Levantei peguei meu laptop e comecei a digitá-las alegremente. Voltamos a nos entender enfim.



6 comentários:

  1. Eis o mistério, o mecanismo intrincado da inspiração. De modo sutil e desesperador chegam sem pedir permissão. E vem a hora que quer, donas absolutas da nossa vontade. Quando menos a esperamos, vem, despejadas em palavras. Gostei, Leila, é assim mesmo.

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  2. Passando para deixar-te os meus mais sinceros votos de um Ano Novo esplendoroso; repleto de alegria, saúde, realizações e muita paz regada à felicidade...

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  3. É belo. Muito belo. E sei que não pensarás que apenas tu esperas por elas. A mesma tortura de que buscaste socorro em Machado, elas sentiriam, se tivessem essa capacidade humana de sofrer. Felizmente, não têm. Mas esperam muitas vezes por ti. Querem falar-te, às vezes, pensas ter visto uma delas aqui ou ali... – e viste mesmo! Mas elas não puderam mostrar-se melhor, porque não estavas pronta! Estavas ocupada com outras coisas. Sei que não pensarás que tu as tens somente nas horas que queres. Tu também lhes pertences no descortinar de um horizonte, numa sombra do arvoredo. Belíssimo texto. Tens um belo coração. Feliz 2015!!! Beijossssssss

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  4. Que delícia de texto, Leila! Ler o seu texto foi um deleite. A sensação de se sentir sem inspiração é mesmo horrível, mas não se preocupe, até Clarice Lispector disse em uma entrevista que passava por esses momentos de completo hiato. Com o tempo, a luz reacende. :)

    Beijos,
    Nina & Suas Letras

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  5. Oi Leila :) Que alegria ter a oportunidade de conhecer seu cantinho, obrigada. Que as doces palavras não te faltem, que a inspiração venha sempre.
    Desejo a você um 2015 cheio de escritos, emoções, felicidades e saúde de sobra!

    Um super beijo com todo meu carinho!

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  6. É assim mesmo! Por vezes, "elas", sem darem a mínima, se vão e nos deixam, aliás, deixam sim, deixam a frustração de não tê-las; não obstante, felizmente, voltam no mesmo silêncio que foram como fieis companheiras.

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Sua visita me deixa muito feliz!