Esta é uma
daquelas histórias que a vida nos presenteia e que deve ser contada e recontada
por muitas vezes em momentos de reunião familiar ou em uma roda de amigos.
Claro que sempre tem aquele que exagera e é logo vaiado e outros que por um
lapso de memória esquecem algum detalhe importante, tornando a história difícil
de entender. Mas vamos a história tal qual me foi apresentada.
Marta estava
voltando de viagem. Não gostava muito de viajar de avião, mas se quisesse rever
parentes em outro estado tinha que se submeter a este martírio. Tentava
aparentar tranquilidade, mostrando aos outros a ideia de que a viagem é uma
coisa trivial e até relaxante, quando na verdade a palma de sua mão estava
suando e as batidas do coração estavam aceleradas. Por um momento pensou em
quantos ali estariam calados como um rato, a sentirem o mesmo que ela. As
poltronas próximas a sua estavam vagas. Olhando ao redor viu uma jovem mulher que aparentava estar passando o mesmo que ela .
Marta tentou-se acalmar e pegou um livro. Pensou em como a ida fora tranquila,
pois tivera a mão do marido para se agarrar, mas por causa do trabalho teve que
retornar mais cedo. Na poltrona da
frente estava sentado um adolescente, que vez e outra se virava para olhá-la. Achou muito estranho aquelas olhadelas
inesperadas e pensou por um momento que
ele a estava paquerando. Sabe aquela fase em que os rapazes ficam com o rosto
cheio de espinhas e os hormônios estão a mil por hora? Pois é, aquela criatura
estava nessa fase, pensou Marta. A ousadia chegou a incomodá-la, mas resolveu ignorar
o abusado e voltou sua atenção para o livro.
A mulher que aparentava
nervosismo caminhou até a poltrona de Marta, cumprimentou-a e sentou-se na
poltrona que estavam vaga. De repente uma voz sonora e bonita começou a falar:
“Atenção senhores passageiros em caso de despressurização as máscaras de
oxigênio cairão automaticamente, caso esteja acompanhado de alguém que
necessite de sua ajuda, coloque sua máscara primeiro para em seguida ajudá-lo.
Queremos lembrar que seus assentos são flutuantes, em caso de pouso na água
retire-o e leve-o para fora da aeronave. Durante a decolagem seus assentos deverão
estar na posição vertical, com as mesas fechadas e travadas.”
Enquanto
se ajeitava na poltrona a mulher começou a esbravejar: “Por que
eles têm que falar essas coisas? Não percebem que nos assustam mais ainda? Quanta
insensibilidade!”
A mulher olhou para Marta e atônita falou: “-Oi ,sou Amanda, estou tão nervosa, odeio
viajar de avião, será que eu poderia segurar na sua mão? ”
Marta
ficou surpresa com aquele pedido repentino, mas também estava precisando de
alguém para tornar aquela viagem menos desgastante, mais que depressa segurou a
mão fria e úmida de Amanda.
As duas
de mãos dadas começaram a conversar, Marta falou sobre sua volta a São Paulo
onde realizava um trabalho como assistente social. Foram muitas perguntas,
respostas e gargalhadas nervosas e assim as duas passaram por aquele momento
amparando-se uma a outra.
De
repente Marta percebeu que algo se mexia entre o vão da poltrona da frente.
Olhou mais atentamente e para seu espanto era a mão do rapaz tentando alcançar
algo no vácuo, pois as pernas de Marta estavam cruzadas, impossibilitando que
ele a tocasse.
Marta
ficou rubra de indignação com tamanho despropósito. As duas se entreolharam
boquiabertas e a mão boba insistia em sua busca. As duas cochicharam uma no ouvido da outra e
prepararam o ataque àquele ato libidinoso. O livro “50 tons de cinza” que Marta estava devorando
acabou virando uma arma e nesse momento um pensamento engraçado a fez rir- o
livro estava assumindo a personalidade do poderoso Christian Gray, personagem do
livro que estava lendo. Sujeito dominador que gostava de bater na hora H. Aquela
mão atrevida estava precisando mesmo de um castigo a la Christian Gray. Esse
pensamento a fez rir internamente por horas.
O livro
foi lançado contra a persistente mão boba, mas por incrível que pareça a mão
continuou o seu intento. O rapaz
continuava sentado e a mão continuava ali no vão da poltrona a buscar algo no
ar. O livro foi usado mais algumas vezes e nada. Aquela história estava muito
esquisita, mas as duas estavam se divertindo muito. Foi quando Marta percebeu
que precisava mudar de tática, pois o livro não estava adiantando nada, a mão
continuava a incomodar mesmo após muitas livradas. Ela já não aguentava mais
aquela situação ,tinha que dar um basta, o rapaz poderia achar que elas estavam
gostando.
Marta
chegou bem perto da poltrona do rapaz e disse bem alto: - “Dá para você colocar
sua mão para frente?” e deu-lhe um beliscão bem forte. A mão boba depois de levar aquele beliscão recolheu-se a sua insignificância e deixou de incomodar.
Elas se sentiram
aliviadas e concordaram que isso não poderia ficar assim, decidiram que quando todos se levantassem para sair do avião
elas iriam ter uma conversa séria com aquele libertino da mão boba.
Finalmente havia
chegado o momento de encarar o dono da mão boba que a incomodara tanto durante
o voo. Elas se levantaram e ficaram aguardando que o rapaz fizesse o mesmo.
Ao lado do rapaz
estava sentado um casal de meia idade que se levantaram. A mulher conversou
algo com o rapaz. Marta percebeu que aquele casal poderia ser os pais dele e
ficou mais indignada ainda com tamanha falta de respeito. De repente o rapaz
começou a soltar uns sons estranhos que mais pareciam grunhidos, se levantou e
com o auxílio da mãe foi andando com dificuldade até o corredor do avião.
Marta e Amanda
ficaram tão chocadas que demoraram a assimilar a situação. O rapaz era um
deficiente mental!
“Já
pensou como seria o título em uma notícia de jornal?” Disse Amanda.
- “Assistente
Social agride deficiente mental em pleno
voo “.
E as duas riram com vontade.
Por Leila Bomfim
25/01/2013
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